Inquietações de um profeta

Depois de ouvir sobre o relato de uma coordenadora de escola pública se justificando para os pais sobre a retirada da comemoração do Dia das Mães do calendário escolar, pois seria ofensivo e que fazia parte da desconstrução do valores tradicionais, na minha mente, que pela graça de Deus ainda é permeada pelo imaginário bíblico, me veio uma imagem muito nítida que passo a expor.
Por que não olhar para esta situação em outra perspectiva? Talvez de modo mais despreconceituoso e humilde? Não será isto efeitos colaterais da ausência de sal no organismo da nossa sociedade?

A tempestade assolava um navio mercante nos mares sul do mediterrâneo. Era das mais fortes já enfrentada pela marujada acostumada às surpresas que o mar esconde. Depois de esgotadas todas as tentativas de manobras, a tempestade continua e o navio está prestes a sucumbir. Todas as preces já foram feitas. Todas as crenças já foram evocadas e todas as divindades invocadas. A decisão difícil é tomada pelo capitão, que não vê outra saída. Vamos alijar a preciosa carga.
Mas, a fúria indomável não perdoa. O mar continua vencendo o homem na sua viagem pela vida. Agora a decisão é ainda mais comprometedora. No desespero pela vida, a ordem agora é destruir o próprio navio e alijar os seus, mastros. Aqueles altos mastros, orgulho da sua tripulação, que impunha força e direção a nau, agora estavam sendo destruídos a rudes machadadas como se fosse um tronco qualquer indesejável. Que situação desesperadora! Perde-se toda a esperança de salvação. Enquanto isto um passageiro dorme indolente no porão da embarcação. Alguém lembra do intruso e misterioso viajante, que nem notara o desespero dos companheiros de viagem que lutavam desesperadamente pela suas vidas. Eram homens que precisavam voltar para suas mulheres e para os seus filhos, eram cargas que precisavam chegar ao seu destino, eram sonhos que ainda resistiam em não terminar ali naquelas águas. Mas, o sono do indiferente é intenso e precisou ser acordado pelos gritos desesperados de um marujo.
De repente, como uma janela que se abre em uma sala escura, Jonas recobra a lucidez e percebe que o problema não está no mar. A fúria das águas era apenas a expressão da ira do Deus vivo pela rebeldia de um profeta que fugia da sua obrigação de ser porta voz dos desígnios de Deus para uma nação. Um profeta que era incapaz de ver aqueles que “não sabiam ainda distinguir a mão direita da esquerda” sendo destruídos e não ser capaz de se compadecer. Um profeta que não era sensível a necessidade de homens e mulheres experimentarem a graça de Deus pelo arrependimento.
O seu orgulho não o impedia ver, fora cego pelo seu egoísmo e indiferença e não era capaz de enxergar a extensão do amor de Deus e a sua responsabilidade nesta tarefa de anuncia-lo. Não entendia que a justiça de Deus é o lado inverso da mesma moeda, onde a face é o amor.
Diante daquele tribunal improvisado, no balanço nauseante do convés molhado e em meio ao assovio agitado do vento, ele confessa o seu pecado e declara-se culpado. Diante daqueles desconhecidos ele mesmo declara a sua sentença de morte, restando ainda o último fio de esperança na misericórdia Divina. Em resoluta atitude, aqueles homens lançam o culpado nas águas enfurecidas como oferta de oblação. A ira desta divindade soberana precisava ser aplacada. Era assim que estes rudes homens do mar entendiam a vida.
Os poderes cósmicos foram abalados pela decisão daquela corte. O sempre eterno endossava ali, naquele alto mar, aquela decisão. A oferta fora aceita. Imediatamente o fúria cessou e o mar acalmou. Os ânimos recobraram e a esperança voltou. Enquanto isto em desesperada agonia o profeta nada tentando manter-se na superfície das vagas e, quando menos espera, é sugado por um grande peixe e ali permanece por três dias e três noites. Que grande lição! Quanta criatividade nesta ação pedagógica. Era hora de fazer o caminho de volta. Enquanto o coração era moldado sob os moldes da compaixão de um Deus que é amor, o vagaroso peixe conduz o seu passageiro de volta ao lugar de onde nunca deveria ter saído – o centro da vontade de Deus.
De forma incrível é vomitado na praia mais próxima ao destino e agora, despojado de qualquer bem, seja material ou seja no coração, olha para a cidade ímpia e contempla a sua missão.
É hora de desincumbir-se dela. Ainda reluta em seu coração, mas será que ouvirão a minha voz? Será que crerão no julgamento divino anunciado? Alguém ouvirá a sentença do altíssimo? Se não fosse as marcas recentes no seu corpo provocadas pela acidez da boca do peixe, estas dúvidas ainda teriam lhe feito retroceder.
Para sua grande surpresa houve arrependimento e comoção geral. Uma cidade inteira rendida aos pés do Soberano do universo. A sentença anunciada foi revogada, pela graça liberada de um coração que se arrepende. Famílias foram poupadas, crianças puderam viver e velhos completaram os seus dias, pois o amor de Deus foi derramado sobre aqueles ímpios e duros de coração e inimigos de Deus, dos quais o profeta tanto implicava.

Será que, como igreja, não temos nada em comum com o profeta Jonas? Será que o problema desta grande tempestade não é interno? Será que o problema não reside no coração rebelde e desobediente do profeta deste tempo? Teremos a coragem de Jonas de declarar a nossa própria sentença? Será que ainda seremos capazes de olhar para estes que tanto censuramos com compaixão? Precisaremos mais uma vez passar pela criativa pedagogia de Deus para trazer de volta o profeta ao seu rumo? Precisamos pensar seriamente sobre isto.
O desespero é grande ao nosso redor. As famílias não possuem mais saída. Falamos de algumas delas, mas eles não as tem. Falamos de Deus mais eles não O conhecem. Falamos de amor, mas eles nunca sentiram o seu efeito. Enquanto isto, filhos não voltam mais para casa, pois sucumbem a violência, os pais não sabem mais o que fazer com os filhos, perdemos o rumo das coisas e a esperança. Vamos alijar a carga? Já o fizemos. Vamos então desconstruir o navio. Esta é a decisão mais lógica de viajantes desesperados sob a tempestade da vida. Eles não precisam de profetas indolentes e religiosos que venham lhes ensinar preces. Eles não precisam de carpinteiros que os impeçam de usar o machado no mastro.

Eles precisam de profetas que se arrependam do seu pecado e resolvam anunciar todo o designo de Deus onde quer que seja. O pecado da nossa nação precisa ser denunciado e seu julgamento anunciado. Deus não suporta mais a mistura da igreja com o mundo. Não cabe a nós conjecturas sobre o resultado, mas cabe a nós confiarmos na graça restauradora e protetora de Deus sobre todos os povos. Ele ainda tem graça suficiente para derramar sobre o Brasil. Que venha o Teu Reino, Senhor!

Por Rubens Cartaxo
Parnamirim, 20 de maio de 2014.

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